quarta-feira, 24 de junho de 2009

Sutilezas II

Havia saído pra escrever sobre filosofia.
Mas, naquele momento, naquele exato instante - súbito e volúvel - consegui sentí-la tocável.

Havia chegado na praça - cheia como em qualquer tarde de folga, onde as pessoas transmitem aquela hipocrisia que costumam denominar 'alegria'.

Mas, bom, tendo cá comigo a minha música e minhas folhas em branco, me viro.

Foi quando olhei para frente. Uma imagem que, mesmo que tente descrever por estas linhas; mesmo que haja reproduções e figuras num papel dessa imagem; mesmo que tudo isso fosse feito, não é possível que haja alguma forma de expressar o que eu realmente vi.

Era uma árvore grande, tal um ipê, intensamente cor-de-rosa.
Cor-de-rosa de rosa de ipê.
E todo esse rosa, a se derramar pelo gramado macio, se espalhava, espreguiçando-se em múltiplos e vivos "rosas" de flores de ipê. E toda a grama verde quase se perdia naquele mar de flores caídas sobre ela e subindo sobre a imensa árvore de cachos cor-de-rosa.

Aí, pensei: Acho que aquele banco ali do lado é um bom lugar.

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"And the 'cotton'...
Cotton's high, Lord,
so high."
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segunda-feira, 15 de junho de 2009

.Flush.

*Flush= rubor, resplendor.

Era uma grama macia. Eram soldados gritando 'Span! Span!'. Eram cheiros livres, de vento, de sol, (e,mais uma vez, de grama macia) que se tornaram odores de eau de cologne num escuro quarto mofado.

Foram sensações ilimitadas - pois que eram sensações libertas das correntes da linguagem. Foram experiências marcadas pela corrente da coleira; pelo escuro quarto mofado; pelo horror daqueles dias de prisão: sem água limpa e sem afeto. Mas, não, ele nunca foi impedido pela coleira do discurso.

Os, cheiros, os gostos, as reações alheias e os insights instintivos se entrecruzam e se transformam num emaranhado de possíveis experiências posteriores, já que produzem um tipo de raciocínio selvagem. Raciocínio não no sentido humano; mas no âmbito da causalidade, de uma causalidade natural e intrínseca aos animais - a todos eles. Que se apóia no agir instintivo; agir que aprende com as experiências passadas e acostuma-se aos efeitos das causas já percebidas.

Pensar sobre as sensações de um ser distinto do ser humano incomoda - pensar sobre algo que ultrapassa as fronteiras da linguagem é desafiador para um simples indivíduo mundano e humano.

Mas a causalidade natural que se apóia nos instintos ainda repousa nos seres humanos, ainda pesa muito na balança (e quem sabe até pesa mais que essa dita razão?). E o instinto, nesse momento, me manda arriscar; me manda entrar nessa mata, nesse selvagem que é o não-humano. Onde nunca poderei alcançar concreta e realmente.

Mas, bom, se ainda puder encostar a mão naquela lisa e fina superfície que nos separa tanto do selvagem, do não-pensar humano - ou do pensar não-humano? -, se ainda puder...

Que o acaso me guie.

(E que o rubor de Flush me faça sentir viva.)

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