sexta-feira, 23 de março de 2012

Sobre névoa e cor


O fio que demarca um indivíduo limita seu espaço enquanto um sujeito. O espaço existente entre um sujeito e outro é uma lacuna - mais que isso, um abismo. O abismo que separa dois sujeitos não se limita à mera contingência da distância, ou do afastamento físico. É, na verdade, inevitável, mesmo que não haja distância física alguma.

A impossibilidade de enxergar o chão do abismo faz com que o sujeito se afunde cada vez mais em si mesmo ao procurar por seu próprio chão; a impossibilidade ainda maior de enxergar o outro lado do abismo reduz o sujeito à sua própria existência medíocre e aprisionada, permitindo apenas o mero vislumbre da paisagem distorcida do outro, tal como um horizonte longínquo e nebuloso, em que montanhas se confundem com o céu cinzento.

E a eternidade de cada um, condicionada à efemeridade da condição humana, torna também eterna a tentativa de interpretar - em vão - o comportamento e os reais anseios do outro. É uma necessidade quase carnal de conseguir ultrapassar o fio de si mesmo e dar uns passeios por aí.

Isso me lembra das mônadas de Leibniz e dos filmes de Bergman. Me traz a imagem de céu nublado e silêncio. Mas também me remete à curiosa e extraordinária capacidade que o ser humano tem de superar - ou ao menos contornar - a pesada realidade do abismo ao seu redor. Como se fosse uma capacidade de auto-encantamento - auto-ilusão, talvez? - que, por um feliz acaso, é compartilhada com o outro.

E aí, o mundo vira cor.

[reflexões sem rigor sobre a simplicidade do ser em mim]


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