domingo, 1 de março de 2020

cicatrizes

Gostaria de dizer que essas olheiras são do carnaval, ou que essa respiração pesada é do resfriado de dois dias atrás. Gostaria de acreditar que essa dor de cabeça é só pelo astigmatismo, e não pela pressão dos maxilares que se comprimem pelo ininterrupto estado de ansiedade. 

Gostaria de falar das marcas de meu corpo como troféus; dessas rugas entre as sobrancelhas como meros frutos da idade, e não da dor dilacerante que transborda pela constrição incessante do rosto. Gostaria de acreditar que essa coluna arqueada não é o resultado de tanto peso morto carregado por tanto tempo, em tão pouco tempo de vida.

Gostaria de ter a convicção de que esse olhar triste e esvaziado retomará o brilho de outrora, ou algum brilho que ainda não encontrou somente por uma questão de tempo, mas que está por vir. Gostaria de acreditar no futuro, nos planos, nas palavras e nas promessas. 

Mas sei que não posso nada disso.

E diante disso, tudo o que faço é zombar dessas olheiras e desses olhos perdidos, pois, ao menos assim, o sorriso permanece o mesmo. 

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